28/05/2008

Contos Múltiplos III - Início - Motivo

- Eu tenho medo de ficar cego.

- Eu também.

- Não, eu falo sério.

- Você não tem motivos pra isso.

- Pra falar sério? Escuta aqui Luísa, quantas vezes eu já te disse...

- Não tem motivos pra ficar cego, Alan. Quantas vezes EU já te disse pra escutar o que eu falo até o final? Depois você fica aí, chorando a...

- Ta, ta, chega. É só que eu tenho medo de ficar cego.

- Mas você não tem motivos para isso!

- E que motivos teria eu pra te contar sempre a verdade?



[continua, acredito]

13/05/2008

Contos Múltiplos II - Final 2

Um dia qualquer de um mês não muito preciso. Eis que surgiu do nada. Aparentemente sem nome, admirando-se do que não é seu; construindo palavras e tecendo letras num bom-passar-de-tempo sem que tivéssemos a chance de revelar sua verdadeira face, uma vez oculta. Vem do Latim, por sua vez desvendamos. Mas seguiu-se a névoa por detrás de um nome marcante. Sua marca sempre fora Nihil.

Mas por quê aparecera? De onde? Para quê? Nas sombras da rede, sua identidade é preservada. Mas sabemos que haverá o dia em que a névoa desaparecerá e veremos o essencial. Veremos o remorso, a saudade, o amor, veremos a verdade. Descobriremos a razão de sua existência, o motivo de sua permanência; que outras palavras escreve em outros recintos, que outros pensamentos ocupam sua mente.

(Talvez até vejamos, através da penumbra, traços femininos de um rosto fino bem marcado por um par de óculos, com uma tímida e desajeitada franja caindo sobre a testa. Ou talvez consigamos perceber a textura da barba por fazer, que disfarça o queixo redondo e dá um ar de maturidade. Ou até mesmo o seu cabelo grisalho-quase-branco, muito comprido, cobrindo toda sua coluna e realçando seu rosto delicado, apesar de enrugado e cansado da vida. Com algum esforço talvez possamos ver a aba do boné virado para trás, e um rosto infantil e belo e povoado por algumas sardas solitárias.)

O prazer do mistério, por enquanto, agrada a ambos os lados. Mas ainda esperamos pelo dia qualquer de um mês não muito preciso, quando a névoa já não estará tão espessa e seu nome marcante será apenas um nome.

07/05/2008

Contos Multiplos I - Final 3

"Com a arma apontada na cabeça, não sabia o que dizer. Poderia pedir desculpas, mas para quê, talvez fugir, mas como? Pensou em rezar um pai-nosso. Como é que começa o pai-nosso mesmo? Não lembra. Não estou mais esperando pela morte, pensa ele. A morte já chegou. A morte me acompanha desde aquele dia. O coração parar de bater, o cérebro parar de funcionar, são só cerimônias. Estou morto desde aquele dia."

Apesar de se sentir morto, vazio, esse rito de morte não estava acompanhado de alívio, mas de uma outra sensação: o medo. Enquanto pensava em como agir, seu corpo, tomado pelo desespero, começava amolecer. Por mais que percebesse o resto de vida se esvaindo por seus poros e que soubesse que nada disso importava e que até merecia o cano gelado em sua fronte, procurava um grão de esperança. Antes que o encontrasse e que verbalizasse a idéia que lhe surgira naquele segundo, sentiu um estouro e sua cabeça encontrou o chão molhado e frio do banheiro.

03/05/2008

Contos Múltiplos II - Final 1 - "derramandoosanguedosegredo.com"

Um dia qualquer de um mês não muito preciso. Eis que surgiu do nada. Aparentemente sem nome, admirando-se do que não é seu; construindo palavras e tecendo letras num bom-passar-de-tempo sem que tivéssemos a chance de revelar sua verdadeira face, uma vez oculta. Vem do Latim, por sua vez desvendamos. Mas seguiu-se a névoa por detrás de um nome marcante. Sua marca sempre fora Nihil.

Não que gostasse daquilo tudo; não - It was like a joke. O dinheiro não era necessariamente atrativo, nem os contatos, nem o perigo: era o glamour que seduzia loucamente aquele corpo sem gosto, sem dono, sem cheiro, de Nihil. Sim, o glamour. Agora estava irreversivelmente empenhado em fazer mais pela família que o acolhera naquela tarde chuvosa, na estrada sem destino. E por si mesmo também.


O grupo tinha história. E nome. Claro, ele não o revelaria, nem o seu verdadeiro quis dizer e-nem-pista-por-favor-não-me-pergunte. Só queria fazer o melhor por seu trabalho, pela tradição sem precedentes, por tudo de mais abstrato que os cercava. Buscar por páginas que mostrassem o que de mais incomum havia no pensamento alheio – e nas manias, convicções, extremismos – era a vida de Nihil. Quer dizer, primeiro era isso, depois se perder mil vezes num emaranhado de não-dizeres para transformar em muros por onde pudesse escalar e ainda sobreviver do outro lado. Podia não parecer, mas era um árduo trabalho.


E muitas vezes dava certo. As vítimas acabavam por entregar identidades para lá do propícias pro seu objetivo: perfeitas. Não era fácil encontrá-las, as que conseguia, depois de todo o processo, iam para a próxima fase, onde o elemento superior as cuidava. As outras, ah, as outras... Nihil as comia. E bem. Com garfo e faca e molho Sakura, por favor.

Contos Múltiplos II - Início - "Pois o contrário de Nada é Nada e assim não se sai do lugar"

Um dia qualquer de um mês não muito preciso. Eis que surgiu do nada. Aparentemente sem nome, admirando-se do que não é seu; construindo palavras e tecendo letras num bom-passar-de-tempo sem que tivéssemos a chance de revelar sua verdadeira face, uma vez oculta. Vem do Latim, por sua vez desvendamos. Mas seguiu-se a névoa por detrás de um nome marcante. Sua marca sempre fora Nihil.
(continua....)